Jung para leigos
Carl Gustav Jung
Jung via o pensamento e o sentimento como
maneiras alternativas de elaborar julgamentos e tomar decisões.
Dentre todos os conceitos de Carl
Gustav Jung, a idéia de introversão e extroversão são as mais usadas. Jung
descobriu que cada indivíduo pode ser caracterizado como sendo primeiramente
orientado para seu interior ou para o exterior, sendo que a energia dos
introvertidos se dirige em direção a seu mundo interno, enquanto a energia do
extrovertido é mais focalizada no mundo externo.
Entretanto, ninguém é totalmente
introvertido ou extrovertido. Algumas vezes a introversão é mais apropriada, em
outras ocasiões a extroversão é mais adequada mas, as duas atitudes se excluem
mutuamente, de forma que não se pode manter ambas ao mesmo tempo. Também
enfatizava que nenhuma das duas é melhor que a outra, citando que o mundo
precisa dos dois tipos de pessoas. Darwin, por exemplo, era predominantemente
extrovertido, enquanto Kant era introvertido por excelência.
O ideal para o ser humano é ser flexível,
capaz de adotar qualquer dessas atitudes quando for apropriado, operar em
equilíbrio entre as duas.
As Atitudes: Introversão e Extroversão
Os introvertidos concentram-se
prioritariamente em seus próprios pensamentos e sentimentos, em seu mundo interior,
tendendo à introspecção. O perigo para tais pessoas é imergir de forma
demasiada em seu mundo interior, perdendo ou tornando tênue o contato com o
ambiente externo. O cientista distraído, estereotipado, é um exemplo claro
deste tipo de pessoa absorta em suas reflexões em notável prejuízo do
pragmatismo necessário à adaptação.
Os extrovertidos, por sua vez, se envolvem
com o mundo externo das pessoas e das coisas. Eles tendem a ser mais sociais e
mais conscientes do que acontece à sua volta. Necessitam se proteger para não
serem dominados pelas exterioridades e, ao contrário dos introvertidos, se
alienarem de seus próprios processos internos. Algumas vezes esses indivíduos
são tão orientados para os outros que podem acabar se apoiando quase exclusivamente
nas idéias alheias, ao invés de desenvolverem suas próprias opiniões.
As Funções Psíquicas
Jung identificou quatro funções
psicológicas que chamou de fundamentais: pensamento, sentimento, sensação e
intuição. E cada uma dessas funções pode ser experienciada tanto de maneira
introvertida quanto extrovertida.
O Pensamento
Jung via o pensamento e o sentimento como
maneiras alternativas de elaborar julgamentos e tomar decisões. O Pensamento,
por sua vez, está relacionado com a verdade, com julgamentos derivados de
critérios impessoais, lógicos e objetivos. As pessoas nas quais predomina a
função do Pensamento são chamadas de Reflexivas. Esses tipos reflexivos são
grandes planejadores e tendem a se agarrar a seus planos e teorias, ainda que
sejam confrontados com contraditória evidência.
O Sentimento
Tipos sentimentais são orientados para o
aspecto emocional da experiência. Eles preferem emoções fortes e intensas ainda
que negativas, a experiências apáticas e mornas. A consistência e princípios
abstratos são altamente valorizados pela pessoa sentimental. Para ela, tomar
decisões deve ser de acordo com julgamentos de valores próprios, como por
exemplo, valores do bom ou do mau, do certo ou do errado, agradável ou desagradável,
ao invés de julgar em termos de lógica ou eficiência, como faz o reflexivo.
A Sensação
Jung classifica a sensação e a intuição
juntas, como as formas de apreender informações, diferentemente das formas de
tomar decisões. A Sensação se refere a um enfoque na experiência direta, na
percepção de detalhes, de fatos concretos. A Sensação reporta-se ao que uma
pessoa pode ver, tocar, cheirar. É a experiência concreta e tem sempre
prioridade sobre a discussão ou a análise da experiência
Os tipos sensitivos tendem a responder à
situação vivencial imediata, e lidam eficientemente com todos os tipos de
crises e emergências. Em geral eles estão sempre prontos para o momento atual,
adaptam-se facilmente às emergências do cotidiano, trabalham melhor com
instrumentos, aparelhos, veículos e utensílios do que qualquer um dos outros
tipos.
A Intuição
A intuição é uma forma de processar
informações em termos de experiência passada, objetivos futuros e processos
inconscientes. As implicações da experiência (o que poderia acontecer, o que é
possível) são mais importantes para os intuitivos do que a experiência real por
si mesma. Pessoas fortemente intuitivas dão significado às suas percepções com
tamanha rapidez que, via de regra, não conseguem separar suas interpretações
conscientes dos dados sensoriais brutos obtidos. Os intuitivos processam
informação muito depressa e relacionam, de forma automática, a experiência
passada com as informações relevantes da experiência imediata.
Arquétipos
Dentro do Inconsciente Coletivo existem,
segundo Jung, estruturas psíquicas ou Arquétipos. Tais Arquétipos são formas
sem conteúdo próprio que servem para organizar ou canalizar o material
psicológico. Eles se parecem um pouco com leitos de rio secos, cuja forma
determina as características do rio, porém desde que a água começa a fluir por
eles. Particularmente comparo os Arquétipos à porta de uma geladeira nova;
existem formas sem conteúdo - em cima formas arredondadas (você pode colocar
ovos, se quiser ou tiver ovos), mais abaixo existe a forma sem conteúdo para
colocar refrigerantes, manteiga, queijo, etc., mas isso só acontecerá se a vida
ou o meio onde você existir lhe oferecer tais produtos. De qualquer maneira as
formas existem antecipadamente ao conteúdo. Arquetipicamente existe a forma
para colocar Deus, mas isso depende das circunstâncias existenciais, culturais e
pessoais.
Jung também chama os Arquétipos de imagens
primordiais, porque eles correspondem freqüentemente a temas mitológicos que
reaparecem em contos e lendas populares de épocas e culturas diferentes. Os
mesmos temas podem ser encontrados em sonhos e fantasias de muitos indivíduos.
De acordo com Jung, os Arquétipos, como elementos estruturais e formadores do
inconsciente, dão origem tanto às fantasias individuais quanto às mitologias de
um povo.
A história de Édipo é uma boa ilustração de
um Arquétipo. É um motivo tanto mitológico quanto psicológico, uma situação
arquetípica que lida com o relacionamento do filho com seus pais. Há,
obviamente, muitas outras situações ligadas ao tema, tal como o relacionamento
da filha com seus pais, o relacionamento dos pais com os filhos,
relacionamentos entre homem e mulher, irmãos, irmãs e assim por diante.
O termo Arquétipo freqüentemente é mal
compreendido, julgando-se que expressa imagens ou motivos mitológicos
definidos. Mas estas imagens ou motivos mitológicos são apenas representações
conscientes do Arquétipo. O Arquétipo é uma tendência a formar tais
representações que podem variar em detalhes, de povo a povo, de pessoa a
pessoa, sem perder sua configuração original.
Uma extensa variedade de símbolos pode ser
associada a um Arquétipo. Por exemplo, o Arquétipo materno compreende não
somente a mãe real de cada indivíduo, mas também todas as figuras de mãe,
figuras nutridoras. Isto inclui mulheres em geral, imagens míticas de mulheres
(tais como Vênus, Virgem Maria, mãe Natureza) e símbolos de apoio e nutrição,
tais como a Igreja e o Paraíso. O Arquétipo materno inclui aspectos positivos e
negativos, como a mãe ameaçadora, dominadora ou sufocadora. Na Idade Média, por
exemplo, este aspecto do Arquétipo estava cristalizado na imagem da velha
bruxa.
Jung escreveu que cada uma das principais
estruturas da personalidade seriam Arquétipos, incluindo o Ego, a Persona, a
Sombra, a Anima (nos homens), o Animus (nas mulheres) e o Self.
Símbolos
De acordo com Jung, o inconsciente se
expressa primariamente através de símbolos. Embora nenhum símbolo concreto
possa representar de forma plena um Arquétipo (que é uma forma sem conteúdo
específico), quanto mais um símbolo se harmonizar com o material inconsciente
organizado ao redor de um Arquétipo, mais ele evocará uma resposta intensa e
emocionalmente carregada.
Jung se interessa nos
símbolos naturais, que são produções espontâneas da psique individual, mais do
que em imagens ou esquemas deliberada-mente criados por um artista. Além dos símbolos encontrados em sonhos ou fantasias de um
indivíduo, há também símbolos coletivos importantes, que são geralmente imagens
religiosas, tais como a cruz, a estrela de seis pontas de David e a roda da
vida budista.
Imagens e termos simbólicos, via de regra,
representam conceitos que nós não podemos definir com clareza ou compreender
plenamente. Para Jung, um signo representa alguma outra coisa; um símbolo é
alguma coisa em si mesma, uma coisa dinâmica e viva. O símbolo representa a
situação psíquica do indivíduo e ele é essa situação num dado momento.
Aquilo a que nós chamamos de símbolo pode
ser um termo, um nome ou até uma imagem familiar na vida diária, embora possua
conotações específicas além de seu significado convencional e óbvio. Assim, uma
palavra ou uma imagem é simbólica quando implica alguma coisa além de seu
significado manifesto e imediato. Esta palavra ou esta imagem tem um aspecto
inconsciente mais amplo que não é nunca precisamente definido ou plenamente
explicado.
Os Sonhos
Os sonhos são pontes importantes entre
processos conscientes e inconscientes. Comparado à nossa vida onírica, o
pensamento consciente contém menos emoções intensas e imagens simbólicas. Os
símbolos oníricos freqüentemente envolvem tanta energia psíquica, que somos
compelidos a prestar atenção neles.
Para Jung, os sonhos desempenham um
importante papel complementar ou compensatório. Os sonhos ajudam a equilibrar
as influências variadas a que estamos expostos em nossa vida consciente, sendo
que tais influências tendem a moldar nosso pensamento de maneiras
freqüentemente inadequadas à nossa personalidade e individualidade. A função
geral dos sonhos, para Jung, é tentar estabelecer a nossa balança psicológica
pela produção de um material onírico que reconstitui equilíbrio psíquico total.
Jung abordou os sonhos como realidades
vivas que precisam ser experimentadas e observadas com cuidado para serem
compreendidas. Ele tentou descobrir o significado dos símbolos oníricos
prestando atenção à forma e ao conteúdo do sonho e, com relação à análise dos
sonhos, Jung distanciou-se gradualmente da maneira psicanalítica na livre
associação.
Pelo fato do sonho
lidar com símbolos, Jung achava que eles teriam mais de um significado, não
podendo haver um sistema simples ou mecânico para sua interpretação. Qualquer tentativa de análise de um sonho precisa levar em conta as
atitudes, a experiência e a formação do sonhador. É uma aventura comum vivida
entre o analista e o analisando. O caráter das interpretações do analista é
apenas experimental, até que elas sejam aceitas e sentidas como válidas pelo
analisando.
Mais importante do que a compreensão
cognitiva dos sonhos é o ato de experienciar o material onírico e levá-lo a
sério. Para o analista junguiano devemos tratar nossos sonhos não como eventos
isolados, mas como comunicações dos contínuos processos inconscientes. Para a
corrente junguiana é necessário que o inconsciente torne conhecida sua própria
direção, e nós devemos dar-lhe os mesmos direitos do Ego, se é que cada lado
deva adaptar-se ao outro. À medida que o Ego ouve e o inconsciente é encorajado
a participar desse diálogo, a posição do inconsciente é transformada daquela de
um adversário para a de um amigo, com pontos de vista de algum modo diferentes
mas complementares.
O Ego
O Ego é o centro da consciência e um dos
maiores Arquétipos da perso-nalidade. Ele fornece um sentido de consistência e
direção em nossas vidas conscientes. Ele tende a contrapor-se a qualquer coisa
que possa ameaçar esta frágil consistência da consciência e tenta convencer-nos
de que sempre devemos planejar e analisar conscientemente nossa experiência.
Somos levados a crer que o Ego é o elemento central de toda a psique e chegamos
a ignorar sua outra metade, o inconsciente.
De acordo com Jung, a princípio a psique é
apenas o inconsciente. O Ego emerge dele e reúne numerosas experiências e
memórias, desenvolvendo a divisão entre o inconsciente e o consciente. Não há
elementos inconscientes no Ego, só conteúdos conscientes derivados da
experiência pessoal.
A Persona
Nossa Persona é a forma pela qual nos
apresentamos ao mundo. É o caráter que assumimos; através dela nós nos
relacionamos com os outros. A Persona inclui nossos papéis sociais, o tipo de
roupa que escolhemos para usar e nosso estilo de expressão pessoal. O termo
Persona é derivado da palavra latina equivalente a máscara, se refere às
máscaras usadas pelos atores no drama grego para dar significado aos papéis que
estavam representando. As palavras "pessoa" e
"personalidade" também estão relacionadas a este termo.
A Persona tem aspectos tanto positivos
quanto negativos. Uma Persona dominante pode abafar o indivíduo e aqueles que
se identificam com sua Persona tendem a se ver apenas nos termos superficiais
de seus papéis sociais e de sua fachada. Jung chamou também a Persona de
Arquétipo da conformidade. Entretanto, a Persona não é totalmente negativa. Ela
serve para proteger o Ego e a psique das diversas forças e atitudes sociais que
nos invadem. A Persona é também um instrumento precioso para a comunicação. Nos
dramas gregos, as máscaras dos atores, audaciosamente desenhadas, informavam a
toda a platéia, ainda que de forma um pouco estereotipada, sobre o caractere as
atitudes do papel que cada ator estava representando. A Persona pode, com
freqüência, desempenhar um papel importante em nosso desenvolvimento positivo.
À medida que começamos a agir de determinada maneira, a desempenhar um papel,
nosso Ego se altera gradualmente nessa direção.
Entre os símbolos comumente usados para a
Persona, incluem-se os objetos que usamos para nos cobrir (roupas, véus),
símbolos de um papel ocupacional (instrumentos, pasta de documentos) e símbolos
de status (carro, casa, diploma). Esses símbolos foram todos encontrados em
sonhos como representações da Persona. Por exemplo, em sonhos, uma pessoa com
Persona forte pode aparecer vestida de forma exagerada ou constrangida por um
excesso de roupas. Uma pessoa com Persona fraca poderia aparecer despida e
exposta. Uma expressão possível de uma Persona extremamente inadequada seria o fato
de não ter pele.
A Sombra
Para Jung, a Sombra é o centro do
Inconsciente Pessoal, o núcleo do material que foi reprimido da consciência. A
Sombra inclui aquelas tendências, desejos, memórias e experiências que são
rejeitadas pelo indivíduo como incompatíveis com a Persona e contrárias aos
padrões e ideais sociais. Quanto mais forte for nossa Persona, e quanto mais
nos identificarmos com ela, mais repudiaremos outras partes de nós mesmos. A
Sombra representa aquilo que consideramos inferior em nossa personalidade e
também aquilo que negligenciamos e nunca desenvolvemos em nós mesmos. Em
sonhos, a Sombra freqüentemente aparece como um animal, um anão, um vagabundo
ou qualquer outra figura de categoria mais baixa.
Em seu trabalho sobre repressão e neurose,
Freud concentrou-se, de inicio, naquilo que Jung chama de Sombra. Jung
descobriu que o material reprimido se organiza e se estrutura ao redor da
Sombra, que se torna, em certo sentido, um Self negativo, a Sombra do Ego. A
Sombra é, via de regra, vivida em sonhos como uma figura escura, primitiva,
hostil ou repelente, porque seus conteúdos foram violentamente retirados da
consciência e aparecem como antagônicos à perspectiva consciente. Se o material
da Sombra for tra-zido à consciência, ele perde muito de sua natureza de medo,
de desconhecido e de escuridão.
A Sombra é mais perigosa quando não é
reconhecida pelo seu portador. Neste caso, o indivíduo tende a projetar suas
qualidades indesejáveis em outros ou a deixar-se dominar pela Sombra sem o
perceber. Quanto mais o material da Sombra tornar-se consciente, menos ele pode
dominar. Entretanto, a Sombra é uma parte integral de nossa natureza e nunca
pode ser simplesmente eliminada. Uma pessoa sem Sombra não é uma pessoa
completa, mas uma caricatura bidimensional que rejeita a mescla do bom e do mal
e a ambivalência presentes em todos nós.
Cada porção reprimida da Sombra representa
uma parte de nós mesmos. Nós nos limitamos na mesma proporção que mantemos este
material inconsciente.
À medida que a Sombra se faz mais
consciente, recuperamos partes previamente reprimidas de nós mesmos. Além
disso, a Sombra não é apenas uma força negativa na psique. Ela é um depósito de
considerável energia instintiva, espontaneidade e vitalidade, e é a fonte
principal de nossa criatividade. Assim como todos os Arquétipos, a Sombra se
origina no Inconsciente Coletivo e pode permitir acesso individual a grande
parte do valioso material inconsciente que é rejeitado pelo Ego e pela Persona.
No momento em que acharmos que a
compreendemos, a Sombra aparecerá de outra forma. Lidar com a Sombra é um
processo que dura a vida toda, consiste em olhar para dentro e refletir
honestamente sobre aquilo que vemos lá.
O Self
Jung chamou o Self de Arquétipo central,
Arquétipo da ordem e totalidade da personalidade. Segundo Jung, consciente e
inconsciente não estão necessariamente em oposição um ao outro, mas
complementam-se mutuamente para formar uma totalidade: o Self. Jung descobriu o
Arquétipo do Self apenas depois de estarem concluídas suas investigações sobre
as outras estruturas da psique. O Self é com freqüência figurado em sonhos ou
imagens de forma impessoal, como um círculo, mandala, cristal ou pedra, ou de
forma pessoal como um casal real, uma criança divina, ou na forma de outro
símbolo de divindade. Todos estes são símbolos da totalidade, unificação,
reconciliação de polaridades, ou equilíbrio dinâmico, os objetivos do processo
de Individuação.
O Self é um fator interno de orientação,
muito diferente e até mesmo estranho ao Ego e à consciência. Para Jung, o Self
não é apenas o centro, mas também toda a circunferência que abarca tanto o
consciente quanto o inconsciente, ele é o centro desta totalidade, tal como o
Ego é o centro da consciência. Ele pode, de início, aparecer em sonhos como uma
imagem significante, um ponto ou uma sujeira de mosca, pelo fato do Self ser
bem pouco familiar e pouco desenvolvido na maioria das pessoas. O
desenvolvimento do Self não significa que o Ego seja dissolvido. Este último
continua sendo o centro da consciência, mas agora ele é vinculado ao Self como
conseqüência de um longo e árduo processo de compreensão e aceitação de nossos
processos inconscientes. O Ego já não parece mais o centro da personalidade,
mas uma das inúmeras estruturas dentro da psique.
Crescimento Psicológico - Individuação
Segundo Jung, todo indivíduo possui uma
tendência para a Individuação ou auto desenvolvimento. Individuação significa
tornar-se um ser único, homogêneo. na medida em que por individualidade
entendemos nossa singularidade mais íntima, última e incomparável, significando
também que nos tornamos o nosso próprio si mesmo. Pode-se traduzir Individuação
como tornar-se si mesmo, ou realização do si mesmo.
Individuação é um processo de
desenvolvimento da totalidade e, portanto, de movimento em direção a uma maior
liberdade. Isto inclui o desenvolvimento do eixo Ego-Self, além da integração
de várias partes da psique: Ego, Persona, Sombra, Anima ou Animus e outros
Arquétipos inconscientes. Quando tornam-se individuados, esses Arquétipos expressam-se
de maneiras mais sutis e complexas.
Quanto mais conscientes nos tornamos de nós
mesmos através do auto conhecimento, tanto mais se reduzirá a camada do
inconsciente pessoal que recobre o inconsciente coletivo. Desta forma, sai
emergindo uma consciência livre do mundo mesquinho, suscetível e pessoal do Eu,
aberta para a livre participação de um mundo mais amplo de interesses
objetivos.
Essa consciência ampliada não é mais aquele
novelo egoísta de desejos, temores, esperanças e ambições de caráter pessoal,
que sempre deve ser compensado ou corrigido por contra-tendências
inconscientes; tornar-se-á uma função de relação com o mundo de objetos,
colocando o indivíduo numa comunhão incondicional, obrigatória e indissolúvel
com o mundo.
Do ponto de vista do Ego, crescimento e
desenvolvimento consistem na integração de material novo na consciência, o que
inclui a aquisição de conhecimento a respeito do mundo e da prória pessoa. O
crescimento, para o Ego, é essencialmente a expansão do conhecimento consciente.
Entretanto, Individuação é o desenvolvimento do Self e, do seu ponto de vista,
o objetivo é a união da consciência com o inconsciente.
Como analista, Jung descobriu que aqueles
que vinham a ele na primeira metade da vida estavam relativamente desligados do
processo interior de Individuação; seus interesses primários centravam-se em
realizações externas, no "emergir" como indivíduos e na consecução
dos objetivos do Ego. Analisandos mais velhos, que haviam alcançado tais
objetivos, de forma razoável, tendiam a desenvolver propósitos diferentes,
interesse maior pela integração do que pelas realizações, busca de harmonia com
a totalidade da psique.
O primeiro passo no processo de
Individuação é o desnudamento da Persona. Embora esta tenha funções protetoras
importantes, ela é também uma máscara que esconde o Self e o inconsciente.
Ao analisarmos a Persona, dissolvemos a
máscara e descobrimos que, aparentando ser individual, ela é de fato coletiva;
em outras palavras, a Persona não passa de uma máscara da psique coletiva. No
fundo, nada tem de real; ela representa um compromisso entre o indivíduo e a
sociedade acerca daquilo que alguém parece ser: nome, título, ocupação, isto ou
aquilo.
De certo modo, tais dados são reais mas, em
relação à individualidade essencial da pessoa, representam algo de secundário,
uma vez que resultam de um compromisso no qual outros podem ter uma quota maior
do que a do indivíduo em questão.
O próximo passo é o confronto com a Sombra.
Na medida em que nós aceitamos a realidade da Sombra e dela nos distinguimos,
podemos ficar livres de sua influência. Além disso, nós nos tornamos capazes de
assimilar o valioso material do inconsciente pessoal que é organizado ao redor
da Sombra.
O terceiro passo é o confronto com a Anima
ou Animus. Este Arquétipo deve ser encarado como uma pessoa real, uma entidade
com quem se pode comunicar e de quem se pode aprender. Jung faria perguntas à
sua Anima sobre a interpretação de símbolos oníricos, tal como um analisando a
consultar um analista. O indivíduo também se conscientiza de que a Anima (ou o
Animus) tem uma autonomia considerável e de que há probabilidade dela
influenciar ou até dominar aqueles que a ignoram ou os que aceitam cegamente
suas imagens e projeções como se fossem deles mesmos.
O estágio final do processo de Individuação
é o desenvolvimento do Self. Jung dizia que o si mesmo é nossa meta de vida,
pois é a mais completa expressão daquela combinação do destino a que nós damos
o nome de indivíduo. O Self torna-se o novo ponto central da psique, trazendo
unidade à psique e integrando o material consciente e o inconsciente. O Ego é
ainda o centro da consciência, mas não é mais visto como o núcleo de toda a
personalidade.
Jung escreve que devemos ser aquilo que
somos e precisamos descobrir nossa própria individualidade, aquele centro da
personalidade que é eqüidistante do consciente e do inconsciente. Dizia que
precisamos visar este ponto ideal em direção ao qual a natureza parece estar
nos dirigindo. Só a partir deste ponto podemos satisfazer nossas necessidades.
É necessário ter em mente que, embora seja
possível descrever a Individuação em termos de estágios, o processo de
Individuação é bem mais complexo do que a simples progressão aqui delineada.
Todos os passos mencionados sobrepõem-se, e as pessoas voltam continuamente a
problemas e temas antigos (espera-se que de uma perspectiva diferente). A
Individuação poderia ser apresentada como uma espiral na qual os indivíduos
permanecem se confrontando com as mesmas questões básicas, de forma cada vez
mais refinada. Este conceito está muito relacionado com a concepção Zen-budista
da iluminação, na qual um individuo nunca termina um Koan, ou problema
espiritual, e a procura de si mesmo é vista como idêntica à finalidade.)
Obstáculos ao Crescimento
A Individuação nem sempre é uma tarefa
fácil e agradável. O Ego precisa ser forte o suficiente para suportar mudanças
tremendas, para ser virado pelo avesso no processo de Individuação.
Poderíamos dizer que todo o mundo está num
processo de Individuação, no entanto, as pessoas não o sabem, esta é a única
diferença. A Individuação não é de modo algum uma coisa rara ou um luxo de
poucos, mas aqueles que sabem que passam pelo processo são considerados
afortunados. Desde que suficientemente conscientes, eles tiram algum proveito de
tal processo.
A dificuldade deste processo é peculiar
porque constitui um empreendimento totalmente individual, levado a cabo face à
rejeição ou, na melhor das hipóteses, indiferença dos outros. Jung escreve que
a natureza não se preocupa com nada que diga respeito a um nível mais elevado
de consciência, muito pelo contrário. Logo, a sociedade não valoriza em demasia
essas proezas da psique e seus prêmios são sempre dados a realizações e não à
personalidade. Esta última será, na maioria das vezes, recompensada
postumamente.
Cada estágio, no processo de Individuação,
é acompanhado de dificuldades. Primeiramente, há o perigo da identificação com
a Persona. Aqueles que se identificam com a Persona podem tentar tornar-se
perfeitos demais, incapazes de aceitar seus erros ou fraquezas, ou quaisquer
desvios de sua auto-imagem idealizada. Aqueles que se identificam totalmente
com a Persona tenderão a reprimir todas as tendências que não se ajustam, e a
projetá-las nos outros, atribuindo a eles a tarefa de representar aspectos de
sua identidade negativa reprimida.
A Sombra pode ser também um importante
obstáculo para a Individuação. As pessoas que estão inconscientes de suas
sombras, facilmente podem exteriorizar impulsos prejudiciais sem nunca
reconhecê-los como errados. Quando a pessoa não chegou a tomar conhecimento da
presença de tais impulsos nela mesma, os impulsos iniciais para o mal ou para a
ação errada são com freqüência justificados de imediato por racionalizações.
Ignorar a Sombra pode resultar também numa atitude por demais moralista e na
projeção da Sombra em outros. Por exemplo, aqueles que são muito favoráveis à
censura da pornografia tendem a ficar fascinados pelo assunto que pretendem
proibir; eles podem até convencer-se da necessidade de estudar cuidadosamente
toda a pornografia disponível, a fim de serem censores eficientes.
O confronto com a Anima ou o Animus traz,
em si, todo o problema do relacionamento com o inconsciente e com a psique
coletiva. A Anima pode acarretar súbitas mudanças emocionais ou instabilidade
de humor num homem. Nas mulheres, o Animus freqüentemente se manifesta sob a
forma de opiniões irracionais, mantidas de forma rígida. (Devemos nos lembrar
de que a discussão de Jung sobre Anima e Animus não constitui uma descrição da
masculinidade e da feminilidade em geral. O conteúdo da Anima ou do Animus é o
complemento de nossa concepção consciente de nós mesmos como masculinos ou
femininos, a qual, na maioria das pessoas, é fortemente determinada por valores
culturais e papéis sexuais definidos em sociedade.)
Quando o indivíduo é exposto ao material
coletivo, há o perigo de ser engolido pelo inconsciente. Segundo Jung, tal
ocorrência pode tomar uma de duas formas. Primeiro, há a possibilidade da
inflação do Ego, na qual o indivíduo reivindica para si todas as virtudes da
psique coletiva. A outra reação é a de impotência do Ego; a pessoa sente que
não tem controle sobre a psique coletiva e adquire uma consciência aguda de
aspectos inaceitáveis do inconsciente-irracionalidade, impulsos negativos e
assim por diante.
Assim como em muitos mitos e contos de
fadas, os maiores obstáculos estão mais próximos do final. Quando o indivíduo
lida com a Anima e o Animus, uma tremenda energia é libertada. Esta energia
pode ser usada para construir o Ego ao invés de desenvolver o Self. Jung
referiu-se a este fato como identificação com o Arquétipo do Self, ou
desenvolvimento da personalidade-mana (mana é uma palavra malanésica que
significa a energia ou o poder que emana das pessoas, objetos ou seres sobrenaturais,
energia esta que tem uma qualidade oculta ou mágica). O Ego identifica-se com o
Arquétipo do homem sábio ou mulher sábia aquele que sabe tudo. A
personalidade-mana é perigosa porque é excessivamente irreal. Indivíduos
parados neste estágio tentam ser ao mesmo tempo mais e menos do que na
realidade são. Eles tendem a acreditar que se tornaram perfeitos, santos ou até
divinos, mas, na verdade, menos, porque perderam o contato com sua humanidade
essencial e com o fato de que ninguém é plenamente sábio, infalível e sem
defeitos.
Jung viu a identificação temporária com o
Arquétipo do Self ou com a personalidade-mana como sendo um estágio quase
inevitável no processo e Individuação. A melhor defesa contra o desenvolvimento
da inflação do Ego é lembrarmo-nos de nossa humanidade essencial, para
permanecermos assentados na realidade daquilo que podemos e precisamos fazer, e
não na que deveríamos fazer ou ser.
Referência
Ballone GJ - Carl Gustav Jung,
in. PsiqWeb, internet, disponível emhttp://www.psiqweb.med.br/,
revisto em 2005
* baseado no livro
"Teorias da Personalidade"- J. Fadiman, R. Frager - Harbra
- 1980
para saber mais: Tipos Psicológicos - C.G.Jung -
Zahar Editores - RJ - 1980




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